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Quando era pequena

Quando era pequena, apaixonei-me. Experienciei tudo a que o amor tinha direito. Os olhares tímidos, os toques leves, as gargalhadas mudas e as bochechas ruborizadas. Era pequena e apaixonada. Porque sou pequena e amo um amor do tamanho do mundo. Talvez só os pequenos saibam amar. Tirei luvas, sapatos, despi o coração. É tão bom ser pequena! Pequena e apaixonada! Sou do tamanho do que amo, e o que amo és tu. Sou gigante, eterna apaixonada. Talvez esteja aprisionada, mas por ser pequena, consigo escapar pelas fendas da minha jaula. Grita comigo, que és pequeno e apaixonado, e que te orgulhas disso!

Canta canções de amor ao meu ouvido, deixa-te desmaiar de emoção, mas nunca cresças. Mas tu quiseste partir. E eu cresci. E já não amo um amor do tamanho do mundo. Agasalhei-me, ando sempre cheia de frio, e agora já sou crescida. Já não sei amar como os pequenos. Agora, sou culta. Sei a história, a geografia, e sei que o amor é só o borbulhar de hormonas.

Mas porque raio eu havia de crescer?

Agora sozinha e crescida, já sou inteligente e toda a gente me aplaude por ter crescido. O amor estalou, e já não sou capaz de amor como os pequenos. Faço faturas, escrevo textos sobre o Presidente Trump e olho a chuva da janela, enrolada em mil mantas, enquanto deixo o vapor do chá embaciar-me os óculos, tal como os adultos fazem. Não sei se cresci, se morri. Já não choro por amor. Acreditam que já nem tenho medo de trovões?

Ser adulto é um caminho sem retorno. De nada vale cobrir a pele com ingenuidade, que nada é o mesmo. Os crescidos não sabem amar. E eu cresci. Talvez um dia me voltes a amar, e eu me torne pequena outra vez.


Texto: Margarida Pereira


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